LNLS
20/11/2018

Cristais de proteínas. [1]
A partir do momento em que uma proteína relacionada a alguma doença é identificada como alvo terapêutico, o estudo de sua estrutura tridimensional – as posições de cada um dos seus átomos e suas interações – permite entender a fundo sua ação no organismo e como um potencial fármaco deve ligar-se a ela. Dessa forma, é possível descobrir potenciais novos fármacos, ou entender o funcionamento de fármacos já conhecidos e aumentar sua efetividade.

A cristalografia de proteínas é uma ferramenta essencial na investigação da estrutura tridimensional dessas moléculas e, consequentemente, de sua função biológica. Tanto que cerca de 90% das estruturas de proteínas atualmente conhecidas foram determinadas utilizando a difração de raios X em cristais de proteína. No entanto, para se aplicar esta técnica é necessário obter um cristal de proteína de qualidade adequada, o que exige condições bastante específicas.

A etapa limitante deste processo é a nucleação, que requer a aglomeração ordenada de moléculas de proteína para dar início ao crescimento do cristal. Existem diversos métodos facilitar essa nucleação (e o crescimento) de cristais de proteína. No entanto a maior parte destes métodos ainda apresenta limitações: muitos não se preocupam em avaliar a qualidade dos cristais formados e outros envolvem o uso de tecnologias sofisticadas.

Em estudo recente publicado na revista ACS Omega [2], Tássia Karina Walter, da Universidade Federal do Paraná, e colaboradores apresentaram um método alternativo para a cristalização de proteínas.

Como modelo, os pesquisadores utilizaram a lisozima, uma enzima com função antimicrobial abundante em secreções como lágrimas, saliva e muco. Essa molécula é capaz de quebrar componentes da parede celular de bactérias, causando sua morte. A lisozima foi a primeira a ter sua estrutura tridimensional elucidada por métodos de difração de raios X.

Em seu novo método, os pesquisadores utilizaram como suporte para a formação do cristal um filme fino constituído pela própria proteína, previamente preparado e submetido a uma diferença de potencial elétrico.

A aplicação da diferença de potencial resulta na orientação das moléculas proteicas no filme, conforme foi verificado por imagens de microscopia de força atômica. O preparo do filme não necessita de recursos sofisticados, podendo ser realizado facilmente em qualquer laboratório de biologia molecular.

Estes filmes, posteriormente utilizados como suporte para o crescimento de cristais sob diversas condições, permitiram um aumento na taxa de nucleação, ou seja, um maior número de cristais em menor tempo de incubação. Em alguns casos, também resultaram na formação de cristais maiores e com morfologia mais regular, o que permite melhor coleta de dados por difração de raios X. Além disso, a utilização desses filmes indica a possibilidade de se obter cristais em condições mais próximas da atividade biológica da proteína (o que permitiria o estudo da sua estrutura na sua forma ativa), enquanto que no método clássico usualmente são empregadas condições mais extremas.

Experimentos de difração de raios X foram realizados na linha de luz MX2 do Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS). Através da análise dos dados, foi possível avaliar a qualidade dos cristais obtidos a partir dos filmes finos e compará-la com o método clássico, utilizado como controle.

Em alguns casos os cristais mostraram propriedades de difração similares ao controle, o que demostra que, mesmo aumentando a velocidade de nucleação é possível coletar dados de difração com boa qualidade. Já em outros casos foi possível aumentar significativamente o limite de resolução dos cristais em relação ao controle, que permite acrescentar informações na construção de modelos da estrutura da proteína.

Deste modo, ao se utilizar esses filmes de proteínas organizadas como suporte para cristalização, abrem-se diversas possibilidades no estudo da estrutura tridimensional de proteínas, incluindo a obtenção de cristais de alta qualidade em condições mais próximas ao papel funcional da proteína, com a utilização de recursos bastante acessíveis.

[1] Crédito da imagem: NASA (Wikipedia), public domain.
https://no.wikipedia.org/wiki/Fil:Protein_crystals_grown_in_space.jpg.

[2] TK Walter et al. Use of Protein Thin Film Organized by External Electric Field as a Template for Protein Crystallization. ACS Omega 10.1021/acsomega.8b01277 (2018).

Como citar esta notícia científica: LNLS. Uma nova abordagem na cristalização de proteínas. Saense. http://www.saense.com.br/2018/11/uma-nova-abordagem-na-cristalizacao-de-proteinas/. Publicado em 20 de novembro (2018).

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