Tábata Bergonci
23/08/2017

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Na década de 1970, os médicos aprenderam como coletar células da pele de um paciente, cultivá-las em laboratório e, em seguida, aplicar o tecido cultivado para fechar e proteger feridas do paciente. Hoje em dia, o transplante de pele em humanos é um procedimento já bem estabelecido. Por esse motivo, a ideia de usar a pele como órgão crucial na terapia gênica é antiga, mas sempre houve um problema…

Quando cientistas testam novas técnicas, terapias ou protocolos, eles não os fazem diretamente em humanos, por razões bastante óbvias (muita coisa dá errado antes de conseguirmos um procedimento de sucesso!). Um dos organismos modelos mais utilizados para testes clínicos são os camundongos. Contudo, transplantes de pele em camundongos não são considerados um sistema bem estabelecido, pois a taxa de rejeição da pele transplantada é alta, entre outros problemas. Mas isso parece estar mudando…

Pesquisadores da Universidade de Chicago desenvolveram um modelo para transplantes de pele de um camundongo para outro, com sucesso acima de 80% [2]. Com isso, eles agora têm um modelo para testar a terapia gênica via pele. E já começaram…

Primeiro, eles coletaram tecido da pele de camundongo e cultivaram em laboratório (em condições ideais, as células da pele continuam se multiplicando fora do organismo). Usando CRISPR (já falei sobre essa técnica aqui e aqui), eles inseriram nas células cultivadas o gene Glucagon-like Peptide 1 (GLP1), que codifica o hormônio responsável por estimular o pâncreas a secretar insulina. O gene inserido continha uma mutação que aumenta o tempo de vida da proteína GLP1 no sangue. Uma outra modificação importante: eles acrescentaram uma região que promove a expressão do gene apenas quando em contato com o antibiótico doxiciclina. As células modificadas foram então crescidas em laboratório e depois transplantadas para camundongos saudáveis.

Quando esses camundongos comiam alimentos contendo o antibiótico, GLP1 era liberada no sangue. Quanto mais antibiótico ingerido, maior a quantidade de GLP1 liberada pelos animais. Como consequência, a insulina aumentava e a glicose diminuía no sangue.

Em um segundo experimento, camundongos foram alimentados com uma dieta rica em gordura, o que os fez ganhar peso. Depois, foi acrescentado a essa dieta o antibiótico. Os camundongos que sofreram o transplante passaram a ganhar menos peso que os que não tinham modificações genéticas. Esses camundongos também apresentaram menor taxa de resistência à insulina (a diabetes tipo II começa assim!).

Os resultados são maravilhosos pois imagine que um transplante de pele com células que sofrerem uma pequena modificação pode combater a obesidade e evitar patologias como diabetes. Com esses achados, a terapia gênica cutânea ganha mais pontos a seu favor: a pele é o maior órgão do corpo humano e o mais acessível para manipulação, fácil de monitorar, e o transplante pode ser removido se necessário. O transplante de pele também é considerado seguro, minimamente invasivo e barato. Próximo passo? Testes em humanos?

[1] Crédito da imagem: Rusty Clark (Flickr) / Creative Commons (CC BY 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/rusty_clark/8339376695/.

[2] J Yue et al. Engineered epidermal progenitor cells can correct diet-induced obesity and diabetes. Cell Stem Cell 10.1016/j.stem.2017.06.016 (2017).

Como citar este artigo: Tábata Bergonci. Terapia gênica via pele pode tratar obesidade e diabetes! Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/08/terapia-genica-via-pele-pode-tratar-obesidade-e-diabetes/. Publicado em 23 de agosto (2017).

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